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Partido Pirata do Brasil

Você já ouviu falar do Partido Pirata? Trata-se de uma organização política que já se espalhou por mais de cinquenta países e que luta por causas ligadas à internet livre, como o compartilhamento de arquivos, reformas em leis de direitos autorais e patentes, transparência governamental e privacidade para os cidadãos.
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Rafael Cabral



 

A versão brasileira do partido está em gestação desde 2007, mas só será fundada oficialmente nesta sábado (28/07), em uma reunião paralela à Campus Party de Recife. A intenção é registrar o partido e conseguir a autorização do Tribunal Superior Eleitoral a tempo para a disputa das eleições de 2014.

Para conhecer melhor essa proposta, o Olhar Digital conversou com Rick Falkvinge, criador do Partido Pirata sueco, o primeiro a levantar a bandeira pirata no mundo. Os piratas suecos estão em atividade desde 2006 e já contam com dois representantes no Parlamento Europeu, o mais importante campo de discussões da União Europeia.

OD - Como você definiria a missão do Partido Pirata para alguém que não é particularmente ligado a internet, ou mesmo que não tenha acesso à rede? O partido pode atender também os desejos dessas pessoas? Como mobilizar um cidadão comum para o futuro da informação quando o fato é que ele provavelmente nem sabe que essa discussão está acontecendo?

PP - Estamos em um estágio importante da humanidade. Quando falo com sociólogos sobre a internet, metade deles fala que a internet é a invenção mais importante desde a imprensa impressa. A outra metade diz que é a invenção mais importante desde a linguagem escrita, criada há 6 mil anos atrás. A razão disso é que a internet dá a todos uma voz.  Se você tem uma voz, você tem poder. Se você não tem uma voz, você depende de alguém para falar por você, e vimos isso acontecer nos últimos séculos. A internet coloca a pirâmide de poder da sociedade de cabeça para baixo, porque as vozes de cidadãos comuns são muito mais expressivas do que a daqueles que desejam falar por eles. Resumindo, não é mais possível mentir e se safar. Isso faz muitas pessoas do sistema a ficarem em pânico. Pela primeira vez na história, uma menina de 9 anos no Paraguai, que acabou de receber um laptop através do programa One Laptop Per Child, tem uma voz tão forte quanto eu, um homem de meia idade que por acaso nasceu na parte mais rica do mundo, a Europa. Eu acho isso fabuloso, e algo que vale a pena ser defendido, tanto pelo lado humanitário quanto pelo político. É por isso que existem os Partidos Piratas.

OD - Você falar das principais causas defendidas pelo Partido Pirata e que medidas políticas práticas vocês já tomaram para realizá-las?

PP - Quando discutimos online, quando usamos a internet para nos comunicarmos, as pessoas se sentem ameaçadas, porque temos uma voz e não dependemos dos intermediários da informação, do conhecimento e cultura. Isso os leva ao pânico e a pensar que as liberdades civis não se estender a nós apenas por que falamos através de uma nova tecnologia, nos comunicamos e compartilhamos experiências através dela. Essa tecnologia torna os políticos obsoletos, e isso é ruim para eles e bom para todo o resto.

O que defendemos é que a cultura compartilhada, o conhecimento livre – o que pressupõe que uma reforma no sistema de patentes e de copyright – , a transparência governamental e a privacidade dos cidadãos. Esses são os quatros pilares do pensamento do Partido Pirata.


OD - Você pode explicar a origem do Partido Pirata sueco e sua disseminação para outros países? De que maneira o funcionamento do Partido Pirata é diferente de outras agremiações?

PP - Sendo um político, eu diria que a possibilidade de se comunicar com privacidade é bem mais importante para a sociedade, para a democracia e para os cidadãos do que um sistema de monopólio da distribuição que serve à indústria do entretenimento. E foi dessa noção que surgimos. Por isso, acreditamos que o monopólio do copyright deve acabar. O Partido Pirata surgiu desse entendimento, de que precisamos da privacidade e do compartilhamento de cultura e entendemos que isso é fundamentalmente bom. Compartilhamento e uso de conhecimento sem a permissão dos autores também é fundalmente bom. Começamos a trabalhar nisso em 2005 e percebemos que o ativismo não era o suficiente, pois os políticos simplesmente não se importavam com esse assunto, eles não entendiam porque era importante e um assunto crucial para as liberdades civis da próxima geração. Por isso, decidimos parar de falar com eles e falar diretamente com os cidadãos, formar um novo partido e desafiar os políticos pelos trabalhos deles nas próximas eleições. E, garoto, isso chamou a atenção deles. O Partido Pirata já está em 50 países, alguns em formação e outros já formados. Temos duas cadeiras no Parlamento Europeu, que conseguimos na Suécia em 2009. Estamos conseguindo progressos na Alemanha, onde já temos 150 pessoas em cargos locais e cerca de 50 em parlamentos estaduais. Existimos em quase todos os países da Europa e estamos chegando na América do Sul, e estou muito animado por ver isso acontecer.

OD - Em que o Partido Pirata se diferencia das outras agremiações?

O Partido Pirata é diferente de outros partidos, precisamos definir um problema, precisamos consertar o problema de que os políticos não entendem as liberdades civis, por causa disso pegamos o nosso respeito pela cultura, pelo conhecimento,  pelo ativismo e por essa organização descentralizada da internet e levamos tudo isso para a política. Desta forma, contrastamos muito com os partidos tradicionais e hierárquicos, nos quais o líder diz algo e os partidários são obrigados a ficar do lado deles. Nós funcionamos da mesma maneira que as redes sociais. Todos tem uma voz, e se você quer liderar você precisa os inspirar os outros a seguirem você, você não pode dizer a ninguém o que fazer. E eu acho isso é um grande ponto positivo.

OD - Como você enxerga o futuro do copyright, das patentes e do conceito de autoria?

PP - O futuro do monopólio do copyright, patentes e autoria será bem diferente do que tem sido, e isso porque não precisamos mais de um intermediário para atingir o mundo. Antes, para conseguir uma única palavra sua publicada você precisava agradar um executivo de uma gravadora ou editora. Você não precisa mais disso. Se você tem acesso à internet, e você nem precisa de um computador porque pode acessá-la em uma biblioteca ou na casa de um amigo, é possível publicar suas ideias para todo o mundo em menos de dez minutos. Isso assusta os velhos intermediários, que não são mais necessários, mas é ótimo para todo o resto. Estamos vendo uma explosão da criatividade, todo minuto o YouTube ganha 72 horas de novo conteúdo. Muito desses vídeos não iremos ou queremos assistir, mas grande parte deles são fantásticos, obras que nunca veríamos no antigo sistema, onde alguém julgaria o que valeria publicar ou não. O que estamos vendo é o fim dos monopólios, pois estamos chegando à conclusão de que os monopólios do copyright prejudicam a criatividade. Muitas das coisas sendo criadas hoje são ilegais. As patentes prejudicam a inovação.

OD - Qual a sua opinião sobre a causa do anonimato e de grupos que a usam no panorama politico, como o Anonymous?

PP - Eu acho o movimento Anonymous fascinante. Ele incorpora grande parte da internet e mostra que suas ideias devem importar, e não quem as está veiculando. As máscaras que as pessoas usam para esconder suas identidades é um símbolo importante do poder da internet. Antigamente, os poderosos poderiam dizer coisas que importariam muito mais, e hoje o que mais importa é se as suas ideias têm mérito, não quem você é.

OD - Você acredita que o Brasil pode ser uma voz importante nessa discussão? O que você conhece da cultura digital brasileira e o que recomendaria para nós nessa área?

PP - O Brasil tem uma posição geopolítica interessante para catalizar essa transformação da economia mundial. Se os Estados Unidos tentam desesperadamente manter a velha ordem, ajudado em grande parte pela mesma União Europeia na qual o Partido Pirata nasceu, não é de interesse da próxima geração de qualquer lugar do mundo que esses intermediários definam como se cria ou se inova. O Brasil sendo uma economia emergente tem uma posição única para dizer em lei e em políticas que não é do seu interesse ficar atrelado aos antigos países coloniais. Por que é disso que estamos falando, colonialismo, é sobre indústrias que dizem a outros países que não é permitido que eles cresçam e ameacem sua posição dominante. Não é do interesse de países assim em concordar com esses termos. E o Brasil tem mostrado admiráveis sinais de que rejeita essas tentativas de diminuir sua economia e seus cidadãos.  Só posso torcer que o Brasil siga nesse caminho, questionando esses monopólios que não atendem em nada os interesses brasileiros. Basta olhar para a história para vermos que qualquer país emergente e economia dominante chegou a esse ponto por copiar, criar e inovar, e por fazer isso sem pedir permissão para ninguém. Essa é a receita-chave para o sucesso, não apenas para o Brasil, mas o Brasil pode tomar uma posição de liderança no mundo e já está no caminho de fazê-lo.

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